quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

O hábito de julgar

Na lição número 12, do livro Palavras de Vida Eterna, de Emmanuel, psicografado por Francisco Cândido Xavier, o estimado benfeitor espiritual reporta-se à última ceia que Jesus fez com Seus discípulos, durante a qual avisa que alguém, entre eles, O trairia.

A história de Judas incomoda-nos tanto, a ponto de rapidamente condená-lo, incriminando-o, senão por gestos e atos de violência – comuns nas festividades de Páscoa – ao menos por pensamento. Mas por que esse fato nos incomoda?

A Psicologia moderna explica e vamos contar uma pequena história, buscando, através dela, responder a essa questão.

“Uma mulher vai ao seu terapeuta, que a atende semanalmente, e entra queixando-se das agressões verbais recebidas do marido, censurando-a por ser péssima mãe e péssima esposa. Diz ela sentir-se agredida e humilhada porque sabe ser ótima mãe e esposa devotada. O médico ouve-a atentamente e, quando ela encerra as reclamações, ele diz:

- Eu não me importaria com isso, mas sim, com a mancha que tem no rosto.

- Eu não tenho mancha no rosto – retruca ela.

- Tem sim, eu estou vendo – afirma o médico.

- Não, eu não tenho – contesta a paciente convicta.

A conversa continua com os queixumes dela. Depois de algum tempo, ele pergunta à mulher:

- Por que você não se incomodou com a minha afirmação de que tinha uma mancha no rosto?

- Porque sei que não tenho – responde ela.

- Eis aí – diz o médico – a resposta que precisava para suas lamentações. Se as agressões do seu marido lhe fazem tanto mal e a incomodam muito, é porque você própria não tem certeza de ser boa mãe e boa esposa. A agressão atingiu-a porque refletiu sobre sua própria realidade interior.”

Certamente, é isso que acontece conosco quando julgamos e condenamos o discípulo leviano e os nossos semelhantes.

Emmanuel traz para nós, na lição acima citada, a essência do ensinamento evangélico do “não julgai para não serdes julgados”, por nós mesmos.

A advertência tem razão de ser, na medida em que conclama à prática do Evangelho como forma de proteção contra nós próprios, permitindo-nos sair desse círculo de sofrimentos em que nos colocamos, pela nossa ignorância das coisas divinas.

O conhecimento e a prática dos ensinamentos de Jesus fazem-nos, lentamente, perceber que somos todos discípulos Dele, e não mestres como muitos supõem, aprendendo a vigilância dos próprios atos, para não fracassarmos mais; e discípulos em testemunho, a fim de aprendermos a exemplificar, compreendendo, agindo e perdoando, como o Mestre sempre fez.

Estamos caminhando com bastante dificuldade, mas através da escola bendita da reencarnação – “Necessário vos é nascer de novo” –, vamos combatendo o egoísmo, sendo menos exigentes nos prazeres egoísticos, percebendo a necessidade do outro. Também já estamos conseguindo ter alguma consciência da necessidade de cuidar da vida espiritual, e não ir somente à caça de bens materiais.

Jesus sabe das nossas limitações e não desconhece nossas fragilidades, e por isso nos conclama, através do Seu amor, refletido em todos os Seus ensinamentos, a desenvolvermos a humildade – sentimento contrário ao orgulho – para que não apenas Ele, mas nós próprios, também, reconheçamos nossos limites. Esse é, sem sombra de dúvida, o primeiro passo para conseguir superar nossas limitações e iniciar a construção do edifício íntimo do Reino de Deus em nossos corações.

Lembra Emmanuel, na obra supracitada, que “na edificação íntima do Reino de Deus, meditemos nossos erros, conscientes ou não, definindo nossas responsabilidades e débitos para com a vida, para com a Natureza e para com os semelhantes e, em todos os assuntos que se refiram à deserção perante o Cristo, teremos bastante força para desculpar as faltas do próximo, perguntando com sinceridade, no âmago do coração: “Porventura existirá alguém mais ingrato para contigo do que eu, Senhor?”

Dia virá em que, revestidos de poder e força, não mais julgaremos nossos semelhantes, pois teremos compreendido que quanto mais força moral e poder tivermos, mais nos compadeceremos das fragilidades humanas e mais estenderemos nossas mãos amorosas para socorrer, elevar e amparar, exatamente como Jesus faz conosco hoje.

Texto escrito por LEDA MARIA FLABOREA (ledaflaborea@uol.com.br), publicado em Crônicas e Artigos, Ano 10 - N° 490 - 6 de Novembro de 2016, no site da Revista O Consolador.